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Por Rafael Oliveira, gestor do Instituto Terra Luminous

 

Imagine duas salas de reunião. 

Em uma, apenas uma voz é ouvida: “Estão todos de acordo?” Silêncio. Ninguém se posiciona. Mais uma decisão tomada e a pauta segue, encaminhando-se uma decisão após a outra quase do mesmo modo.

Na outra sala, o oposto. Muita conversa, discussões acaloradas, diversos pontos de vista, ora entrando em conflito, ora se complementando. São trocas muito ricas e significativas, as pessoas saem fervilhando de ideias. Mas não chegamos nem a ouvir a pergunta se todos estão de acordo. Nenhuma decisão é tomada e quase nada é encaminhado. 

Em qual dessas duas salas de reunião você e sua organização se encontram? Na primeira, onde impera a eficácia no cumprimento da pauta, ou na segunda, onde reina a equivalência entre as pessoas presentes?

Os dois cenários trazem desafios. 

No primeiro, a ilusão de que a eficácia por si só traz resultados. Na verdade, muitas das decisões aparentemente tomadas sem engajamento, comprometimento e responsabilização das pessoas presentes, no fim, não são de fato realizadas. A própria equipe acaba sabotando as ações que nascem de uma decisão meramente protocolar, de um ambiente em que as vozes não se sentem seguras e confiantes para se manifestar, onde possivelmente imperam medos, desconfianças e concentração de poder por meio de uma cadeia de comando e controle.

No segundo cenário, aparentemente já há um poder bastante distribuído, algo que se encontra em organizações de cunho associativo ou em coletivos. Todos sentem-se seguros para se posicionar, as vozes encontram um lugar para serem ouvidas, há equivalência entre as pessoas. Só que aí, uma reunião em que precisam ser tomadas decisões que encaminhem ações, acaba se tornando um interminável fórum de discussão onde nada é decidido.

Em 10 anos prestando consultorias a organizações e implementando um sistema de governança dentro de nossa própria casa, o Instituto Terra Luminous, temos aprimorado bastante nossas práticas, que compartilhamos por meio de nossos cursos.

Nesse artigo, quero de forma breve contar um pouco de como lidamos com os desafios para conseguirmos hoje de forma mais assertiva combinar equivalência com eficácia na gestão de um coletivo feito de muitas vozes. 

Por equivalência, entendemos ser a igualdade de condições entre as pessoas, garantindo que todas as vozes sejam ouvidas e consideradas de maneira justa. Isso cria um ambiente onde a diversidade de perspectivas é valorizada, contribuindo para decisões mais bem fundamentadas e representativas do grupo como um todo.

Por outro lado, a eficácia é medida pela capacidade de alcançar os objetivos estabelecidos pela equipe ou organização. Isso significa que, além de garantir a igualdade de participação, é essencial que as decisões tomadas sejam capazes de promover resultados concretos e alinhados com as metas estratégicas da organização.

Portanto, equilibrar equivalência com eficácia na tomada de decisão envolve não apenas escutar todas as opiniões, mas também direcionar o processo para que resulte em escolhas que não apenas reflitam a diversidade de pontos de vista, mas também impulsionem o progresso e o sucesso coletivo da equipe ou organização.

Para equilibrarmos equivalência e eficácia no ITL temos três grandes práticas baseadas na Sociocracia e na Comunicação Não-Violenta que iremos aprofundar no Lab S3 – Bases e Princípios da Sociocracia – de 2 a 4 de Agosto de 2024.

1) Abrir espaço para o que está vivo ser manifestado

O medo de se posicionar em uma reunião estratégica é muitas vezes um sintoma de um baixo engajamento entre os membros da equipe, que por sua vez é alimentado pela ausência de um espaço genuíno de escuta. 

A escuta eficaz vai além de simplesmente ouvir palavras. Ela requer a criação de um ambiente seguro onde cada indivíduo se sinta confortável para expressar suas emoções em relação ao trabalho e aos projetos em discussão. 

No ITL, temos o hábito semanal de realizar um encontro apenas com o objetivo de “esvaziar a mochila emocional” de cada integrante. Não é uma reunião com caráter decisório. Ela serve para que cada um compartilhe seus sentimentos, dentro de um rito planejado, cuidadoso e facilitado sempre por alguns de nossos membros, para que se crie um campo livre de julgamentos e onde possa imperar a verdadeira autenticidade de cada ser.

Assim, como a oportunidade de se vulnerabilizar, se abrir, temos também a oportunidade de nos conhecermos mais, de enxergarmos o ser humano para além do papel que cumpre dentro da organização. A partir desses encontros, vemos como aumenta o senso de engajamento e motivação das pessoas com o projeto e, logo, suas contribuições com ideias e opiniões dentro das instâncias apropriadas. 

Este espaço de escuta não apenas fortalece o senso de pertencimento e colaboração, mas também prepara o terreno para uma tomada de decisão mais eficaz e assertiva nas reuniões subsequentes, que por sua vez também precisam estar organizadas em diferentes instâncias, o que vem ao encontro da nossa segunda prática.

2) Criar diferentes instâncias de tomada de decisão com agendas próprias

Para que cada reunião equilibre melhor a eficácia e a equivalência, é crucial em primeiro lugar estabelecer um equilíbrio na agenda das diferentes reuniões com maior clareza sobre os objetivos que se deseja alcançar com cada uma. A abordagem que utilizamos para isso no ITL é a criação de círculos de tomada de decisão, onde a equipe é dividida em grupos menores e mais táticos. 

Nesses círculos menores, cada questão pode ser debatida de maneira mais focada e detalhada, com aqueles que estão diretamente envolvidos nela, permitindo que decisões menores sejam tomadas de forma mais ágil e eficiente. E quando a questão impacta mais de um círculo ou o coletivo como um todo, essas decisões são levadas para círculos mais abrangentes, onde são discutidas em um contexto mais amplo e integrador, com representantes de outros círculos.. Esse processo não apenas facilita a gestão de opiniões divergentes, mas também promove uma tomada de decisão mais ágil e alinhada aos objetivos organizacionais.

Ainda assim, decisões que têm maior impacto na organização podem encontrar dificuldades para avançar. Isso pode ocorrer pelo receio de tomar decisão sobre estratégias de maior complexidade ou pelo medo de consequências indesejadas. Esse desafio vem ao encontro da terceira e última prática.

3) Estabelecer prazos para validação de decisões

Uma prática fundamental que aprendemos com a Sociocracia é colocar as decisões dentro de um ambiente de teste com um prazo determinado e geralmente não muito longo para serem avaliadas.

Afinal, nunca podemos ter certeza absoluta de que um caminho é o melhor antes de efetivamente trilhá-lo. Mesmo que possamos supor, apontar riscos e analisar a situação por diversas perspectivas, tudo o que teremos no final do dia são hipóteses. E hipóteses precisam ser testadas.

Portanto, é crucial buscar uma solução que seja “suficientemente boa para o momento e segura o suficiente para ser tentada”. Isso implica não esperar pela perfeição, mas sim em tomar decisões baseadas em informações disponíveis e em um tempo viável. 

Ao adotar essa abordagem, as equipes podem explorar novos caminhos, aprender com experiências práticas e ajustar suas estratégias conforme necessário. Essa prática não apenas acelera o processo decisório, mas também promove um ambiente de aprendizado contínuo e adaptação, essencial para o sucesso a longo prazo das organizações que adotam a sociocracia, como o ITL.

Acredita que faz sentido as práticas que compartilhei aqui? Então deixe seus comentários e, se interessar, conheça mais sobre a vivência do Lab S3 – Bases e Princípios da Sociocracia, que iremos realizar de 2 a 4 de Agosto de 2024, aprofundando as práticas aqui apresentadas junto com outros princípios e estudos de caso dentro de nosso Centro de Retiros, em Juquitiba, a 70 km de São Paulo. 

 

O Terra Luminous é um Instituto Socioambiental e um Centro de Retiros e Experiências. Ambos geridos por um grupo de pessoas que escolheram morar e trabalhar juntos. Dá para imaginar quão importante é ter ferramentas de gestão e cuidado com as relações que garantam um campo de confiança e equivalência com eficácia, né?

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