Parte 2: Problema x Solução por Fabi Maia
Seguindo na linha da investigação do que aproxima e do que afasta alguém quando estou num debate e quero mais conexão, apresento a segunda renúncia… essa bem desafiadora!
Vamos ver como na prática funciona vencer o vício de procurar problema em tudo e direcionar a mente para buscar uma solução.
Imagine alguém dizendo:
“- Vivemos em comunidade e são sempre as mesmas pessoas que não se engajam nas atividades coletivas. Isso não pode continuar assim.
“- Não aguento mais pegar 2 horas de ônibus para trabalhar todo dia! Isso está acabando comigo.”
“- Ontem nossa vizinha foi assaltada em casa. Sinto que existe uma ameaça real onde moramos. Não vou mais conseguir dormir direito aqui.”
Três cenas que despertam uma vontade enorme de dar um conselho, de indicar uma ação corretiva.
Meu radar interno logo detecta que existe um problema a ser resolvido. A angústia pode ser percebida à distância e algo em mim quer eliminar esse sentimento horrível o mais rápido possível. Até parece que a angústia ou a tristeza possam ser contagiosas.
Condicionamento que vem do pensamento linear, patriarcal que objetifica o que vem do campo emocional e valoriza apenas o que gera ação.
O convite é simplesmente fazer companhia no que a pessoa do outro lado está vivendo. “Nada precisa ser resolvido. Aliás, não existe um problema.” – é o mantra da vez.
Vejo esse condicionamento mental, de detectar qual é o problema e pensar numa solução, vindo do modos operandi da sociedade que herdamos. Acredito que somos responsáveis e temos o poder de transformar esse padrão, ainda que, isso exija muito investimento na consciência e esteja restrito a certos extratos sociais mais privilegiados. Esse mundo moldado à luz da engenharia, do racionalismo científico está levando a humanidade inteira, e tantas outras espécies, à extinção. Na verdade, não temos escolha nesse momento. Em cada fala, em cada ação que coloco consciência dos impactos, estamos reforçando o velho mundo decadente ou energizando uma nova sociedade baseada no ganha-ganha-ganha. E para instalarmos o chip da Cultura Regenerativa, é preciso que cada pessoa escolha uma nova rota para as interações beco-sem saída, dando o primeiro passo!
Existe uma gama de emoções sendo expressas e queremos apenas nomeá-las, checar se é isso mesmo que a pessoa está experimentando.
Mas se o contexto da cena sem conexão é o trabalho… aí ferrou. Porque lá então, há tão pouco espaço para que a subjetividade seja protagonista e impera uma super valorização na agilidade para a tomada de decisões.
Esse híper-foco em resolver problemas foi poeticamente ilustrado por Charles Chaplin em Tempos Modernos, alertando essa civilização para a mecanização humana. Um processo de robotização tão claro de se observar que as pessoas se relacionam com uma máquina mais do que com outras pessoas em presença e menos ainda com a natureza.
O tempo do humano-máquina é rápido e sua mente é binária. O código-fonte instalado está programado para: 1. detectar o problema, 2. encontrar a solução e 3. executá-la.
Sentimentos? Nessa programação dá um bug feio quando esse ser entra em contato com sentimentos.
Te convido para, nos 3 próximos dias, colocar uma lupa nas suas interações e perceber os momentos em que seu piloto-automático está ligado em problema x solução. Simplesmente se observe atuando nesse padrão e perceba como está o fluxo de conexão entre as pessoas envolvidas. Se assim escolher, respire fundo, foque a presença total no que está por detrás das palavras, nas expressões emitidas, caçando os sentimentos que estão ali e conte para outra pessoa o que você escutou que ela disse, com suas palavras, acessando o campo emocional com reverência.
A experiência da empatia, que pessoalmente só consigo quando abandono a programação problema x solução, me leva para uma sensação de plenitude e mais sentido para a vida.
Muitas vezes o que acontece depois de horas, dias ou meses investindo na conexão é que os encaminhamentos para as angústias vão fluindo naturalmente, só que com uma qualidade relacional muito elevada, me lembrando que pensar com o coração deve ser nessa rota!
Nota pós-publicação
Ana, integrante da Círculo de Comunicação do Terra Luminous, retrucou ao ler esse artigo: “não consigo incorporar a frase – Não existe um problema e buscar solução salta aqui dentro…”
@Ana Paula Alcantara , “não existe um problema a ser resolvido” é um mantra, uma frase mental que me ajuda a focar minha atenção no que estou buscando: o campo subjetivo emocional, onde moram os sentimentos, sensações, necessidades e valores, onde encontro a humanidade do outro. Continuar escolhendo focar no problema x solução é uma armadilha para culpabilizar alguém. E assim, o jogo vítima x vilão se perpetuar.